Porque a realidade do subúrbio não tem que ser necessariamente má!

domingo, 14 de dezembro de 2008

Irreversible - Gaspar Noé

“O filme narra, de trás para frente, a história de uma vingança. A primeira sequência mostra dois amigos desesperados, Marcus (Vincent Cassel) e Pierre (Albert Dupontel), saindo pelo submundo de Paris à procura do homem que teria violado e espancado Alex (Monica Bellucci), a actual namorada de Marcus e ex-namorada de Pierre. Em seguida, a narrativa volta passo a passo no tempo para mostrar como Marcus e Pierre descobriram o nome do autor do crime, recuando até à própria violação e aos eventos que a antecederam.”


A primeira vez que vi o Irreversível passei o filme a tapar os olhos com as mãos. A sucessão caótica de imagens, os diálogos relâmpago inesperados, o som enjoativo e a frieza das circunstâncias e dos acontecimentos deixaram-me completamente KO. Nunca tinha visto nenhum filme de Gaspar Noé então e não estava habituada ao seu realismo cru, nem às imagens brutais que apresenta nos seus filmes. Sinceramente, no início pensei que o filme não passava de um mero conjunto de imagens que se sucediam umas às outras de trás para a frente. Pensei que estava desprovido de qualquer conteúdo e beleza. Contudo, mais tarde, dediquei-me a conhecer um pouco mais da obra deste realizador e hoje afirma-se para mim como um grande pensador no mundo do cinema.
Noé, através do seu método implacável de mostrar a realidade nua e crua, trabalha conceitos, pensamentos, ideias. O enlace das imagens não é arbitrário, mas possui uma lógica e uma simbologia muito fortes. Através da vertigem das imagens pretende provocar o espectador, fazer com que, através do vómito psicológico, algo mexa dentro dele ( e não só o jantar que comeu antes de ver o filme!). Se analisarmos cada sequência do filme, podemos ver que da fealdade das imagens do quotidiano nasce uma beleza inigualável. O seu cinema é a vida, não um conjunto de imagens utópicas que nos fazem aguentar melhor o percurso da nossa existência. Numa espécie de masoquismo, mostra-nos como as pequenas coisas do quotidiano, por mais simples que sejam, nos aliviam do sofrimento do dia-a-dia. Após o enjoo vem sempre o prazer, depois do esforço do terror, experimentamos o alívio de estarmos livres.
O irreversível espelha exactamente a realidade de que existem factos que nos rodeiam que jamais podem ser mudados. Existem coisas que não podem ser alteradas. A acção humana, por pior ou melhor que seja, é definitiva. Quando a montanha russa pára, só temos que sair, recuperar o equilíbrio e andar para a frente.

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